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Você quer o que deseja?

 Um dos cônjuges “quer” manter o casamento e continuar amando seu companheiro(a), mas se apaixona e “deseja” fulminantemente outra pessoa.  Alguém “quer” emagrecer, pois está acima do peso, mas “deseja” comer para além da necessidade, ato que se impõe compulsivamente.
           
 Outro, “quer” muito viajar, mas uma fobia por avião lhe impede de realizar sua vontade, obrigando-o a não viajar. Que “desejo”, esconde-se aí?  A vontade é da ordem da consciência, posto que nos damos conta do que queremos, mas o desejo é inconsciente, e responsável pelos caminhos que parecem impor-se a nós, obrigando-nos a submetermo-nos a uma outra lógica. A contradição entre a vontade e o desejo é um dos tantos quebra-cabeças, que nos conflituam. Há a possibilidade de coincidirem esse dois campos?
            
De acordo com a concepção psicanalítica, “desejo” é algo decorrente da vivência da falta, que, na melhor das hipóteses, constitui o ser humano, e que nos obriga a ir em busca de algum objeto que supostamente o satisfaria. O que desejamos de fato, nem sempre é tão visível! Por isso fazemos escolhas de toda a ordem, buscando sempre uma “realização”. Mas, e por que então nunca nos realizamos plenamente, e somente de forma fugaz, como flashes, que por segundo aplacam a inquietude que nos con-forma, forma? Queremos algo agora, alcançamos e desejamos sempre mais além...  além. Nunca estamos satisfeitos, vivemos em falta permanente.
            
O legal é quando há a possibilidade de um encontro entre esses dois campos, nem que seja periódico e finito. A maturidade pode proporcionar isso: quando tomamos pé, com maior clareza, quanto ao que desejamos o rumo é sempre mais preciso e consistente ao passo que quando não temos acesso a isso, qualquer caminho pode ser um caminho e qualquer pessoa pode ser “aquela” pessoa.
            
Ao proferir uma palestra nos últimos dias alguém perguntou como podemos fazer quando aquilo que desejamos não coincide com o que a sociedade preconiza que seja certo ou errado, ou quando há um choque quanto a isso. Nos conformamos com as regras sociais ou seguimos o nosso desejo? O preço do submetimento ao poder do outro todos sabemos qual é. A voz que cala é aquela se mostra de outras formas: através de sintomas físicos ou psíquicos, atos de agressão visíveis ou indiretos. Há como tamponar o desejo, a verdade de cada um, que apesar de estar encoberta, se impõe? Será que se trata de seguir sempre o próprio desejo? Lacan fala “não ceder do próprio desejo”. Essa seria a posição ética talvez mais digna e viável para cada um. Mas isso também não nos causaria problemas?
           
 Como seria cada um agindo de acordo com o seu  próprio desejo, como é o caso das crianças pequenas, onde isso fica mais visível? A realização ou não, do desejo é sempre trançada com a presença do outro, aquele que permite, impede ou posterga a realização. A diferença entre a realização de um desejo infantil, como o de morte de um irmão recém-nascido, por exemplo,  e o de um adulto, vem enlaçada com a questão da responsabilidade.
            
Talvez essa dimensão seja um referencial de até onde podemos ir ou não, na busca da realização do desejo, quando ele é acessível. Conseguimos assumir a responsabilidade pelos próprios atos, tanto para o bem quanto para o mal? É diferente deixar de fazer algo por estar subjugado pelo poder do outro e tomar a mesma atitude por uma questão de opção. Posso cumprir uma determinação da empresa que devo sorrir sempre como um dever, como também posso sorrir por que considero conveniente e um ato de esperteza para manter o meu emprego, mesmo que intimamente discorde. São posições diferentes.
            
Enfim, justificando as aspas na nominação desse artigo “Você quer o que deseja?”, esse é o título de um livro de Jorge Forbes, psicanalista carioca.


Por: Návia T. Pattussi

Psicanalista

Fonte: MARCOS A. BEDIN
MB Comunicação Empresarial/Organizacional

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